Morte súbita, morte prolongada e o preparo legal para enfrentar o fim

Boa parte da população deseja uma morte súbita. Aquela clássica, que a pessoa dorme e não acorda, vai abrir a geladeira e cai dura, vai jogar futebol e fica no campo, tem uma dor no peito e já chega no hospital morto.

Seria muito bom se fosse assim, mas infelizmente, essa possível “sorte” é para muito poucos. Em uma palestra no Festival inFinito, realizado em setembro de 2019 na Unibes Cultural, a Dra. Ana Cláudia Quintana Arantes declarou que de cada dez pessoas, nove vão passar pelo processo de terminalidade. Se não escolherem cuidados paliativos, vão amargar dias e dias nos hospitais, sendo furadas e examinadas de todas as maneiras e, não raras vezes, implorando para  morrer em paz, para morrer com dignidade.

Embora a distanásia – prática de prolongar a vida com sofrimento – seja proibida pelo Conselho Federal de Medicina – CFM em seu Código de Ética, ela acaba acontecendo com mais frequência do que se gostaria. E quem está no corredor, esperando sua vez para partir, muitas vezes a enfrenta, para seu desespero e o de seus familiares.

O que fazer? O paciente se vê impotente, a família também. Os médicos têm a missão de salvar a vida, mesmo quando ela já quase se esvaiu.

Quase nada pode ser feito para que essa pessoa possa ter uma morte digna, se ela não se planejou e deixou determinado como gostaria de enfrentar os seus últimos dias.

Como se prevenir?

Quem se preveniu pode aceitar ou recusar tratamentos. O CFM, em seu Código de Ética garante a recusa terapêutica, que é possibilidade do paciente recusar qualquer tratamento que não queira. Mas não é só no Código que existe essa possibilidade. A lei paulista conhecida como “Mário Covas” (Lei nº 10241/99) deixa “consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação, procedimentos diagnósticos ou terapêuticos a serem nele realizados” (art. 2º,VII); ela também permite “recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para tentar prolongar a vida” (art. 2º, XXIII).

A boa e mais importante notícia é que o Código de Ética Médica de 2018 ainda prevê o respeito à autonomia do paciente: “o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas (Capítulo I, art. XXI)” e, claro, que não firam as previsões legais. 

Mas não é só! A Resolução 1995/12 do CFM estabelece a possibilidade do paciente manifestar suas diretivas antecipadas de vontade, deixando  seus “desejos, prévia e expressamente manifestados”, mas sobre esse assunto e o testamento vital, falaremos em um outro post.